Se avaliarmos o que é ser homem à luz da modernidade, não compreenderemos o real sentido da vida
Creio que o Deus morto por Nietszche foi agora ressuscitado, numa versão mais sofisticada ao sabor da terceira modernidade. Esta tentativa vem desde a primeira modernidade, no Éden, após a queda de Adão, quando ele quis ser como Deus declarando a sua independência em busca de sua autonomia. Nova tentativa de um upgrade de Deus foi feita na segunda modernidade, iniciada por volta da época cartesiana, lançando-se o homem como fonte da verdade científica. O período ficou conhecido simplesmente como Modernidade.
Em todas estas versões há uma transposição em que o homem busca ser o seu próprio Deus. Na última, o homem-Deus já não usa mais a capacidade da independência de escolha concedida na Criação ou a razão como sua garantia de afirmar a verdade por si – mas a sua natureza mais primitiva (o cérebro reptiliano) como fonte de verdade ética e moral. A sua vontade de potência, descrita por Nietszche, ou seus instintos, aqui entendidos em termos ontológicos e não psicanalíticos, é que determinam as suas decisões. É uma ética irresistível representada em frases como “Quando você se dá conta já rolou” ou como na música popular intitulada Deixa a vida me levar, que tem versos como: “Fiz o que estava a fim de fazer (...) Meu coração mandou, eu fiz” ou, ainda, “O meu coração está em paz”.
As pessoas têm procurado um Deus que atenda às suas demandas, em vez de buscar a razão de suas vidas em Deus. Nesta versão, Deus deixa de ser o Senhor e passa a ser uma espécie de súdito ou gênio da garrafa, um servo com poder para atender aos desejos das pessoas. Assim, inverte-se a ordem da Criação – o Criador serve à criatura.
É preciso considerar que o homem não foi criado para ser Deus, mas para ser simplesmente homem. Se continuarmos avaliando o que é ser homem à luz do paradigma da modernidade, não compreenderemos o real sentido da vida. Neo, protagonista da série de filmes Matrix, negou a sua suposta liberdade tomando a pílula vermelha e achou a realidade. Nós também precisamos negar essa nossa falsa liberdade, voltando ao estado original do Éden. Aí, encontraremos a verdadeira liberdade para qual fomos criados. Esse é o paradoxo do cristianismo – o negar-se a si mesmo e caminhar em direção à ressurreição e a uma nova vida, conforme Lucas 9.23 e Romanos 6.
A nossa vida só tem sentido em Deus, em versão única e completa. Nós só precisaremos, então, ser humanos. Simplesmente isso!
* texto extraído da revista Eclésia, escrito por Lourenço Stelio Rega, teólogo, educador e escritor
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