O diferencial de Davi

Parece que de todas as personagens que lemos na Bíblia, tem algumas que nos chamam mais a atenção que outras. É claro que a história de cada pessoa registrada no Texto Sagrado é absolutamente indispensável porque tem algum valor e ensino para nós. Porém, existem algumas pessoas que vão além disso. Nos marcam tão profundamente a ponto de nos levarem a uma reflexão e uma busca de mudança de vida. Davi é um destes homens. A sua história é, ao mesmo tempo, uma demonstração de confiança em Deus e, em outros momentos, de fraqueza e inoperância. É impressionante ver alguém que, num momento enfrenta gigantes e os vence e em outro se lança mortalmente numa paixão proibida. Esse desnível de Davi só revela uma coisa: o homem segundo o coração de Deus pode até errar, porém, tem alguma coisa no seu ser que agrada a Deus. É claro que não é o seu erro. Mas, a vida de Davi nos leva a pensar que, a partir do seu deslize, alguma coisa pode acontecer na nossa existência que mudará nossa história. É assim a história de Davi. Por isso, talvez, ela seja tão lida e tão meditada. E talvez também porque pareça com a história de todos nós. Quem nunca pecou que atire a primeira pedra! Talvez atentar para as palavras de Samuel seja a melhor maneira de entender o diferencial de Davi. O próprio Senhor disse para o sacerdote-profeta-juiz: “o homem vê o exterior, mas Deus olha para dentro do coração“(parafraseado).

O que tinha Davi no seu coração que chama tanto a atenção de Deus? Podemos concluir que muitas virtudes como a humildade, simplicidade, temor, singeleza, bondade e desejo de Deus. Estas e outras virtudes eram bastante visíveis na vida deste homem. Porém, havia algo que mexia dentro dele que fazia o Senhor se agradar dEle. O próprio Davi revelou isso numa das suas poesias mais memoráveis entre as escritas: “um coração contrito e quebrantado não desprezas, ó Deus”. Aqui está o segredo de Davi. Não eram as suas muitas virtudes que impressionavam ao Senhor, mas o fato de ele sempre trazer a memória e ao coração que carecia terrivelmente da graça de Deus. Ele disse: ”Clamou este pobre, e o SENHOR o ouviu, e o livrou de todas as suas angústias”. Foi assim que Ele se tornou um homem segundo o coração do Pai. A sua humilhação diante do Senhor e o reconhecimento que não merecia favor divino algum eram que movia a mão de Deus sobre Ele. Insofismavelmente e injustificadamente, entregava-se à graça do Senhor e por esta Graça vivia. Foi assim quando Saul o perseguiu, quando Absalão tentou usurpar o trono, quando já era velho e não podia mais manejar a espada. Foi assim também quando cuidava das poucas ovelhas do seu pai e não tinha ninguém para reconhecer este trabalho, que por sinal era função dos escravos.

E nós, os cristãos da modernidade, temos esse coração? Só lateja profundamente dentro de nós o nosso direito ferido quando o exaltamos acima do dever de amar e perdoar sem olhar a quem se faz. É tempo de parar, olhar para o alto, deixar caducos sentimentos individualistas de lado e perceber que a vida é maior que nós mesmos, maior que nossa própria vida, do que sentimos, pensamos e fazemos. Só fazendo assim, se desprendendo de nós mesmos, da nossa própria vida é que poderemos um dia dizer: “a graça é melhor do que a vida”. Eu quero isso pra mim. Sei que dói muito, mas quero construir um patrimônio imaterial, que dura para vida eterna, e sei que isto só é possível quando o nosso solo não for o das nossas impressões, sentimentos e razões, mas o solo de rocha, da rocha da pederneira, como bem disse Moisés no Deuteronômio. Ele é a nossa rocha. Era a rocha de Davi também. Aqui estava o seu diferencial. Deus nos abençoe!